Mais rápido que o coelhinho da Duracel, Pedro Passos Coelho surge a dar um entrevista em horário nobre, na TVI, poucas horas depois de se confirmar que Manuela Ferreira Leite não se recandidatará à liderança do PSD, e menos de 48 horas depois da derrota autárquica do seu partido. Este é um ponto prévio de reflexão: para quem diz não ter pressa, Passos Coelho pareceu precipitar-se na escolha do tempo.
De relevante disse o que inequivocamente já se sabia há muito: é candidato à liderança do PSD. Era o momento certo de o dizer? A seguir ao suicídio que seria fazê-lo em campanha autárquica, era o segundo momento possível. Demasiadamente apressado, a meu ver. Pelos tempos que referi acima. Mas também admito que não tivesse outras hipóteses: os espaços mediáticos estavam condicionados pela omnipresença de Pacheco Pereira, Marcelo Rebelo de Sousa e outros. Que iam impondo a sua ideia dilatória. Passos Coelho entendeu, melhor ou pior fazâ-lo já. A uns terá soado como punhalada nas costas da liderança. A mim pareceu-me o tradicional PSD afogueado, ainda que lhe reconheça a desvantagem na presença televisiva face aos opinion makers do partido.
Na substância contudo, creio que cometeu três erros fundamentais.
1) A forma como avançou com a ideia de ser candidato, única razão para dar uma entrevista hoje, obrigava-o a ser igualmente lesto, se era importante marcar território a pedir eleições antecipadas no partido. Se, como diz, alguma coisa resultou da plataforma de debate que andou a promover, terá já a vantagem de um programa e sabemos que, melhor ou pior, tem uma equipa. O receio impediu Passos Coelho de exigir já eleições. E o tempo, funcionará sempre contra ele. Permite a organização aos adversárias. E permite a percepção, muito justa aliás, de que as ideias que andou a debater não eram tão boas quanto isso. O caso da privatização da CGD é paradigmático. É original alguém apresentar-se como candidato a líder de um partido a ter de explicar um erro da sua primeira candidatura. E não ficou claro que Passos Coelho entenda porque é que é errado privatizar a CGD sejam quais forem as circunstâncias. Ele acha errado, "neste contexto". Eu pergunto se ele tem a percepção de que uma crise financeira pode voltar a suceder rapidamente e que um grande banco público é essencial na estabilização, em conjunto com o Banco de Portugal? O PS tem uma posição clara sobre a CGD enunciada pelo PM: é pública! Qual a posição de Passos Coelho?
2) Para além da urgência do anúncio implicar uma consequência de urgência de eleições que ele não se atreveu a pedir, e além da ideia de que afinal a plataforma de reflexão não o preparou a ser já candidato, Passos Coelho terá alienado apoios e arranjado inimigos nesta apresentação televisiva. O estatuto dos Açores é uma brincadeira face ao caso das escutas, na óptica do Presidente da República. Sabemos que o cavaquismo nunca estaria com Passos Coelho. Mas podem estar os barrosistas, delfins eleitos de Cavaco, ou os mendistas, leais ao PR, depois de Passos Coelho questionar a conduta de Cavaco neste caso, dizendo-o fragilizado?
Pessoalmente não posso concordar mais com a honestidade de Passos Colho. Cavaco está mais que fragilizado. Mas não tenho memória de alguém a líder do PSD nos últimos 15 anos começando por ferir de morte Cavaco Silva. Por muito que o partido esteja revoltado com o PR, e por muito que os cavaquistas estivessem sempre contra Passos Coelho, a percentagem residual que lhe desse o benefício da dúvida não terá aceite esta posição de bom grado. E isto só fomenta o surgimento de um candidato, que unificando as alas barrosistas, mendistas e com o beneplácito de Cavaco, possa ser imbatível para Passos Coelho.
3) Eu não sei se Passos Coleho se deu conta mas foi tremendamente deselegante a forma como, enquanto candidato a líder se apresentou ao seu hipotético grupo parlamentar. Começar por apelar à substituição da velha guarda, quando ela está em peso no grupo parlamentar do PSD, de Couto dos Santos a Deus Pinheiro, passando por Pacheco Pereira, Passos Coelho terá dado um grande passo em relação a um hipotético relacionamento difícil com a liderança do grupo parlamentar do PSD.
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A sua posição sobre os estímulos do estado, a mudança de rumo na CGD, e o fim da tese da asfixia, ideias com as quais, enquanto independente de esquerda só posso concordar, podem ter tido o ónus de ferir a simpatia que os liberais do partido teriam por ele. Ainda que ligeiramente.
Em suma, se Passos Coelho sabia que ia falar hoje, precisa de rever quem lhe escreva os guiões. Porque hoje ele deu um presente à tal velha guarda do PSD.